Curso de analise sensorial de mel abre horizontes para o setor no Espírito Santo
Fotos: Julio Huber

Texto: Julio Huber
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Pela primeira vez no Espírito Santo, foi realizado um curso de análise sensorial de méis. Promovido pela Associação de Meliponicultores Capixabas do Espírito Santo (Amecap-ES), o treinamento ocorreu em Domingos Martins, nas montanhas capixabas, e reuniu 26 participantes, entre apicultores, meliponicultores, chefs de gastronomia e pessoas ligadas ao setor.
Embora focado especialmente nos méis de abelhas sem ferrão (meliponicultora), o curso também abordou características dos méis produzidos por abelhas com ferrão (apicultura). O objetivo foi que os produtores passem a identificar, classificar e comunicar melhor ao consumidor sobre os atributos de cada variedade.
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Os participantes puderam aprofundar conhecimentos sobre sabor, aroma, características florais e qualidade dos diferentes tipos de mel produzidos no Espírito Santo. Entre os objetivos do curso estão: apoiar a biodiversidade e valorização de produtos da sociobiodiversidade brasileira; estimular o consumo consciente e qualificado de méis nativos e artesanais e qualificar produtores, chefs, nutricionistas, empreendedores e entusiastas.
Quem conduziu o treinamento foi o professor e Doutor Carlos Gustavo Nunes Silva, de Santa Rosa de Lima (SC), município reconhecido por lei como capital nacional da meliponicultora. Ele é analista sensorial de mel, certificado pela American Honey Tasting Society (AHTS) e possui Registro Internacional de Análise Sensorial de Mel.

O especialista disse que compreender o mel além de seu uso medicinal e introduzi-lo na gastronomia é um caminho para valorizar tanto o produto quanto a biodiversidade brasileira. Ele destaca que o Brasil possui mais de 250 espécies de abelhas sem ferrão, sendo cerca de 40 delas potenciais produtoras de mel.
“As abelhas sem ferrão são pouco conhecidas ainda no Brasil, apesar de serem abelhas nativas e estavam aqui antes dos colonizadores chegarem. Os nossos indígenas e as populações nativas já cultivavam essas abelhas, já faziam extração desse mel. Quando os colonizadores chegaram aqui no Brasil, com certeza o primeiro mel que eles provaram foi o mel de abelha sem ferrão”, informou.
Segundo ele, o mel é uma fotografia da biodiversidade e deve ser cada vez mais introduzido na gastronomia. “Cada espécie de abelha e cada ambiente imprimem características únicas. Esse mel carrega nuances, aromas e acidez que podem transformar a experiência gastronômica”, afirmou.
O professor ainda destacou que o brasileiro foi ensinado que mel serve só para remédio, usado como xarope para combater tosse e dor de garganta. “Se a gente entender o mel como um acompanhante, um coadjuvante, ou até uma estrela principal de um prato, ele fará parte da gastronomia e podemos usufruir dessa diversidade”, destacou.
A intenção é de que os participantes do curso passem a apreciar o mel de outra forma e o enxergando como um alimento. “Esperamos que essas pessoas possam ser multiplicadoras desse conhecimento para que a gente passe essas informações para quem consome, para quem produz, para quem utiliza o mel de alguma forma, na culinária, na indústria, enfim, para que as pessoas, conhecendo o mel de uma maneira mais profunda, comecem a valorizar e comecem a utilizá-lo”, enfatizou o professor.
Produtores capacitados para agregar valor ao mel capixaba
Para os participantes, o curso abriu novas perspectivas de mercado e ampliou o entendimento sobre o próprio produto. Marcos Dias, da Dias Florestal, de Santa Teresa, e membro da Amecap, ressalta que a formação permitirá aos produtores mostrar ao cliente as diferenças entre os méis e agregar valor ao produto.

Segundo ele, o aprendizado inclui desde a identificação de defeitos até o reconhecimento do ponto ideal de colheita e armazenamento. “O produtor agora consegue entender melhor o sabor, o odor e as características próprias do mel que ele produz. Assim, será possível agregar valor ao produto e apresentar melhor ao cliente os detalhes de cada mel, como o tipo de florada, detalhes do sabor”, afirma.
Um dos idealizadores do evento, o meliponicultor Germani Baptista Herzog, do Meliponário Herzog, em Domingos Martins, destaca que a capacitação surgiu do desejo da associação de trazer algo inovador para os associados. “É o primeiro curso desse tipo no Espírito Santo. Queríamos oferecer algo que realmente fizesse diferença na rotina dos produtores”, comenta.

Ele contou que entre os aprendizados está principalmente o de conseguir classificar os méis e entender os defeitos presentes no produto. “Agora saberemos explicar melhor ao cliente quais são as notas que aquele mel tem. Conseguiremos mostrar uma maior intimidade com o mel e passar confiança para pessoa que tá adquirindo esse mel. Poderemos apresentar um mel mais suave, mais marcante, mais ácido, por exemplo”, apontou.
Segundo Herzog, quem participou do curso vai olhar de uma outra forma ao produto. “A primeira coisa é sentir o cheiro, que muitas vezes não corresponde ao gosto. Ele tem um cheiro, uma nota floral, por exemplo, mas na hora de sentir o paladar você já descobre outras notas e sabores. São essas percepções que a gente não tinha, e o curso abriu nossos olhos para o mundo”, afirmou.
Para Felipe Schneider, que também participou da formação, o curso representou uma jornada de descobertas. “Foi uma jornada de descobertas, onde os participantes aguçaram os sentidos para explorar a complexidade e a diversidade do universo méis.

Através de provas orientadas, aprendemos a identificar nuances de aroma, sabor, textura e cor, indo muito além do simplesmente ‘doce’. Cada amostra contou uma história sobre a florada e sobre as abelhas. Mais do que uma capacitação, o curso cultivou um novo olhar, apreciando o mel como um produto único e sofisticado”, afirmou.
O jovem produtor Leonardo Pereira, de 29 anos, morador de Alto Jucu, em Domingos Martins, contou que cria abelhas desde a infância, em uma tradição iniciada pelo pai e pelo avô. Após enfrentar perdas ao longo dos anos – causadas por venenos e ataques -ele retomou a atividade com mais dedicação e viu no curso uma oportunidade de ampliar conhecimentos.

Participando pela primeira vez de uma capacitação voltada à análise sensorial de mel no Estado, Leonardo afirma que agora passa a observar detalhes antes despercebidos, como aroma, textura, origem e florada. Com uma produção ainda pequena e sem marca formal, ele vende parte do mel para amigos, mas acredita que o aprendizado adquirido o incentiva a evoluir e a profissionalizar sua produção de mel de abelhas sem ferrão.
“Provamos os méis, mas muitas vezes aparentava ser o mesmo mel, mesmo sendo diferente um pouco, como a coloração. Nunca paramos para nos aprofundarmos em textura, sabor, cheiro, e agora é tudo diferente. O que vai mudar agora é que a atenção da gente vai estar mais ligada nisso. Antes a gente provava o mel, botava na boca, pegava outra caixa, provava da mesma forma. Agora vamos parar para analisar, entender de onde veio, a origem, a textura, a florada, a identificar se é mais amadeirado, mais suave, floral…”, explicou.
Para viabilizar a formação, a Amecap contou com apoio de parceiros locais, como a Coroa e o Sicredi, além de colaboradores da região e produtores envolvidos na organização. As parcerias permitiram reduzir os custos e ampliar o acesso dos participantes ao treinamento.
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