⭐ EXCLUSIVO: uso de carvão e lenha para cozinhar pode agravar quadro clínico de pacientes com Covid-19, alerta estudo

Fotos: Internet

Mais de 23 mil famílias no Espírito Santo passaram a utilizar lenha ou carvão para preparar alimentos em 2019

Bruno Faustino

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Pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), campus de Jerônimo Monteiro, no sul capixaba, estão desenvolvendo um estudo que associa o uso de combustíveis sólidos da biomassa (carvão vegetal e lenha) no agravamento do quadro clínico de pacientes contaminados pelo novo coronavírus (Covid-19). 

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“Nosso ponto de partida para o estudo foi a engenharia/infraestrutura dos equipamentos utilizados para combustão – entre eles, fogões, grelhas e fornos – não desempenharem a queima completa da lenha e do carvão vegetal. Isso resulta numa grande quantidade de gases tóxicos por meio da fumaça de matérias particulados que, muitas vezes, são invisíveis, e são respirados pelas pessoas. Esses gases são responsáveis por ativar os macrófagos (células de defesa do organismo) que atuam no organismo para o combate à Covid-19”, explicou o pesquisador e doutor em Recursos Florestais do Departamento de Engenharia Florestal e Engenharia Industrial Madeireira da Ufes, Ananias Francisco Dias Júnior.

Durante um churrasco, o carvão libera, pelo menos, 16 compostos cancerígenos, segundo estudos da Universidade Federal do Espírito Santo

REALIDADE – Em todo o mundo, há mais pessoas usando lenha e carvão vegetal do que em qualquer outro momento da história humana. Esta realidade é ainda mais presente nas zonas rurais onde o uso de biomassa animal, como restos de ossos, carcaças e dejetos animais também são muito utilizados. Em muitos países e regiões em desenvolvimento, a biomassa é o principal recurso energético para cozinhar, aquecer e iluminar. As estimativas são de que 2/3 da população do mundo a utilize para a cocção de alimentos. Cozinhar frequentemente com a biomassa tem sido associado à baixa renda familiar. 

A pizza assada no forno à lenha também oferece risco

Porém, segundo as primeiras informações levantadas pela pesquisa, em classes sociais mais elevadas também é observado o uso, como no tradicional churrasco, ou o bife super gourmet como o “dirty steak”, ou ainda em pizzarias e culinária a base de fogão a lenha, principalmente durante o isolamento social imposto pela pandemia do novo coronavírus, quando as pessoas estão mais em casa e cozinhando mais. 

Dirty Steak é um método de cozimento usado por vários chefes. A técnica surgiu em meados de 1960, nos Estados Unidos. Cozidos diretamente no topo da brilhante brasa do carvão vegetal, as carnes emergem com uma crosta crocante carbonizadas

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Espírito Santo tem uma área rural de 3,25 milhões de hectares, com 357 mil pessoas trabalhando com atividades agropecuárias, entre elas, lavouras, pastagens e matas. Já a área urbana capixaba possui uma população economicamente ativa de cerca de 1,8 milhão de pessoas. Dentre os segmentos que mais crescem no Brasil, muitos estão relacionados à alimentação, destacando as churrascarias e pizzarias. 

O país é o 6º maior consumidor de carne do mundo, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), e estima-se que o consumo de carnes aumentará em cerca de oito milhões de toneladas (17%) até 2027. Além disso, os brasileiros ocupam a 2º posição do ranking de consumo de pizzas do mundo (são produzidas cerca de um milhão de pizzas por dia). E esses ramos alimentícios dependem da utilização da biomassa para cocção.  

“Vários estudos estão sendo realizados nesse sentido em muitos países do mundo. O que estamos tentando fazer é mapear e regionalizar essa realidade, primeiramente, para o Espírito Santo e, em seguida, para o Brasil”, relatou o pesquisador.

Acompanhe a entrevista exclusiva sobre a pesquisa

Mulheres mais vulneráveis

O Brasil tem 965.512 casos e 46.842 mortes pelo novo coronavírus confirmadas até as 13h desta quinta-feira (18), de acordo com o levantamento feito pelo consórcio de veículos de imprensa a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde. No Espírito Santo são 30.508 casos confirmados e 1.179 mortes. As mulheres são maioria entre os infectados capixabas. Juntas, elas somam 15.894 casos. 

O levantamento inicial da pesquisa da UFES aponta que as mulheres e crianças são as que mais adquirem doenças crônico-respiratórias, por serem as responsáveis pelo preparo dos alimentos ou da chefia da cozinha. Uma pessoa que vive em uma área com altos níveis de gases poluentes é mais propensa a desenvolver condições respiratórias crônicas e suscetíveis a qualquer agente infeccioso. 

A engenharia/infraestrutura dos equipamentos utilizados para combustão – entre eles, fogões, grelhas e fornos – não desempenham a queima completa da lenha e do carvão vegetal. Isso resulta numa grande quantidade de gases tóxicos por meio da fumaça de matérias particulados que, muitas vezes, são invisíveis, e são respirados pelas pessoas

Isso pode afetar a suscetibilidade e a resposta a infecções virais, dentre elas, a Covid-19. Além disso, a exposição a poluentes do ar pode alterar a função de proteínas que estão associadas a maior suscetibilidade a infecções por vírus respiratórios. 

Mais de 23 mil famílias no Espírito Santo passaram a utilizar lenha ou carvão para preparar alimentos em 2019. Somente em Vitória, dobrou o número de domicílios que contam com esse método para produzir refeições – de dois mil para quatro mil – entre 2018 e 2019. Vitória é um dos municípios mais urbanizado no Estado e um dos mais urbanizados no país, de acordo com os dados da Pesquisa Nacional de Domicílios Contínua (Pnad-C) do IBGE. 

RESULTADOS – Os resultados da pesquisa devem sair em seis meses. O Espírito Santo é pioneiro na abordagem do tema no Brasil. “Outros estudos já constataram essa relação. Três deles na China. O problema é que cada Estado brasileiro tem feito uma contagem diferente. E juntar todos os dados do ES e do país é o que está dando mais trabalho. Esperamos que, com o estudo, conseguimos mapear quais regiões são mais vulneráveis relacionando com os infectados pela Covid-19 e possíveis mortes provocadas pelo agravamento do quadro clínico após o uso da biomassa na cocção”, finalizou o pesquisador.

Participam da pesquisa Ananias Francisco Dias Júnior, Fabíola Martins Delatorre, Gabriela Fontes Mayrinck Cupertino e Álison Moreira da Silva.

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Bruno Faustino

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