Cafeicultores planejam “operação de guerra” para transportar trabalhadores para a colheita do café

Muitos cafezais do Espírito Santo e Minas Gerais estão situados em regiões montanhosas onde a colheita dos grãos é feita manualmente

Bruno Faustino

“Estamos prevendo uma verdadeira operação de guerra”. A frase dita pelo cafeicultor Elio Ribeiro Filho, 43, de Brejetuba, Região Serrana do Espírito Santo, retrata bem a situação dos produtores de café dependem de mão de obra de outros estados para a colheita dos grãos, que se aproxima. Ele possui 600 mil pés de café em duas propriedades, e a chegada do mês de abril trouxe apreensão.

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“A gente não estava dando muita bola para o novo coronavírus, mas, agora, estamos assustados, já que o Covid-19 mata”

Elio Ribeiro Filho – cafeicultor

Este ano, as condições climáticas favoreceram o amadurecimento dos grãos e, por isso, alguns cafeicultores das montanhas capixabas precisarão antecipar a colheita. “A colheita que iniciávamos no final de maio vai começar no final de abril. Eu costumo contratar pessoas de longe para a ‘panha’, geralmente, do norte de Minas Gerais, Alagoas e Pernambuco, já que é muito café para colher. E o transporte desse pessoal? Estamos prevendo uma verdadeira operação de guerra”, relata Elio.

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Foto: Acervo Pessoal

O cafeicultor Elio Ribeiro Filho diz que não estava dando muita bola para o novo coronavírus, mas, agora, está assustado

O cafeicultor é cooperado da Cooperativa Agropecuária Centro Serrana (Coopeavi) e tem feito um planejamento minucioso para evitar que pessoas que contraíram o novo coronavírus venham para o Espírito Santo trabalhar durante a colheita do café. “Nós vamos ter que entrar em contato com as secretarias de saúde das cidades desses trabalhadores para que a primeira barreira seja feita lá. Vamos precisar dobrar a quantidade de vans ou contratar ônibus para evitar aglomeração”, diz.

Na propriedade, durante o período de trabalho dos colhedores, o cafeicultor também já está adotando as orientações da Secretaria de Estado da Saúde, Ministério da Saúde e Organização Mundial da Saúde (OMS). “Aqui na fazenda é mais fácil. A própria lavoura permite um distanciamento do pessoal, todos trabalham com equipamentos de proteção. O mais difícil será o transporte”, reafirma o cafeicultor.

E não é somente nas montanhas capixabas que os cafeicultores estão preocupados. Em Minas Gerais, produtores das Matas de Minas também ficaram apreensivos com a chegada do novo coronavírus no Brasil. “Estamos preocupados com a segurança dos nossos trabalhadores e nossas famílias”, conta Róger Lúcio Alves da Fonseca, cafeicultor em Lajinha.

Foto: Acervo Pessoal

O cafeicultor Róger Lúcio Alves da Fonseca disse estar preocupado com a segurança dos trabalhadores e da família

Ele integra o quadro de associados da Cooperativa dos Cafeicultores de Lajinha (Coocafé) e possui 315 mil pés de café, distribuídos em 70 hectares. Este ano, espera colher três mil sacas e, durante a colheita, contrata 40 a 50 trabalhadores. “Vai ser preciso mudar a forma de transportar esse pessoal. Em vez de 40, capacidade do ônibus, teremos que ocupar apenas 20 lugares. Vamos trabalhar seguindo todas as orientações das autoridades, sem desrespeitar nenhuma delas”, ressalta.

Produtor deve retardar a colheita, orienta Incaper

O Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) desenvolveu, junto com a Secretaria de Estado da Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca (Seag), uma cartilha para cafeicultores sobre a colheita do café em 2020. A orientação do coordenador de Cafeicultura do Incaper, Abraão Carlos Verdin Filho, é para que os produtores retardem a colheita este ano, não somente por conta da pandemia do novo coronavírus, mas para uma melhor qualidade dos grãos.

“A partir da florada do cafezal, que aconteceu entre julho e setembro do ano passado, os fatores climáticos foram favoráveis para a cultura do café, ou seja, nós tivemos chuvas além da média e isso favoreceu na diminuição da temperatura. Com isso, as plantas cresceram mais, desenvolveram mais e produziram mais folhas. Tudo favoreceu o desenvolvimento fisiológico da planta e os frutos vão demorar mais para madurar. Os clones precoces, que maduram no final de abril, vão demorar 15 dias a mais para estarem prontos. Isso para uma maturação de 80% de café cereja, que é o ponto ideal para colheita”, explica Verdin.

Foto: Acervo Pessoal

As boas condições climáticas favoreceram o desenvolvimento fisiológico dos cafezais

O Espírito Santo tinha, até esta segunda-feira (13), 430 casos confirmados do novo coronavírus (Covid-19), com 14 mortes confirmadas pela Secretaria de Estado da Saúde. As autoridades estimam que o pico da pandemia em terras capixabas seja entre final de abril e início de maio. Para Verdin, a espera para o início da colheita pode diminuir o contágio entre os trabalhadores. “Se retardar a colheita, o produtor conseguirá colher o café maduro, com frutos mais pesados e com maior rendimento e ainda passar o pico da pandemia”, diz.

A cartilha contendo orientações para os cafeicultores sobre as condutas a serem adotadas durante a colheita já está disponível na internet (baixe a aqui a Cartilha Colheita do Café 2020). Dentre as medidas: no campo, deve ser disponibilizado água limpa e sabão para higienização de mãos e partes expostas sempre que necessário; não devem ser compartilhadas garrafas de água, copos, talheres e outros objetos de uso pessoal; não devem ser contratados trabalhadores inseridos no grupo de risco para o novo coronavírus, neste período de enfrentamento à pandemia; as camas do alojamento devem ter espaçamento de um metro de distância mínima entre elas. A cartilha também contém informações gerais sobre o coronavírus.

Mão de obra local pode substituir trabalhadores do outras regiões do País

Os decretos dos governos estaduais para distanciamento social da população, o fechamento do comércio, centros comerciais e proibições de aglomeração trouxeram impactos para a economia. Segundo previsão da Fundação Getulio Vargas (FGV), a economia brasileira poderá ter contração de 4,4% em 2020, com riscos de a atividade ainda sentir efeitos negativos “significativos” até 2023.

Em todo o mundo, a crise gerada pelo Covid-19 pode aumentar o número de desempregados em quase 25 milhões, segundo estimativa da Organização Internacional do Trabalho (OIT), e uma perda de renda do trabalhador de 3 trilhões de dólares. O Brasil e o Espírito Santo estão incluídos nesta conta.

Foto: Divulgação

O deputado federal Evair de Melo é presidente da Frente Parlamentar do Cooperativismo, vice-presidente da Frente Parlamentar do Café e membro da Frente Parlamentar da Agropecuária

Para o deputado federal Evair de Melo, presidente da Frente Parlamentar do Cooperativismo, vice-presidente da Frente Parlamentar do Café e membro da Frente Parlamentar da Agropecuária, a colheita do café irá absorver está mão de obra que perdeu o emprego durante a pandemia.

“Como o comércio e as empresas estão fechados, teremos oferta de mão de obra de quem está parado nas cidades. Os cafeicultores precisam aproveitar esses trabalhadores que perderam seus empregos durante a pandemia”, ressalta o parlamentar.

Durante a colheita do café, o Espírito Santo recebe, geralmente, pessoas do norte de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e Alagoas. Evair de Melo faz campanha entre os cafeicultores para que eles contratem mão de obra local para colher o café nas propriedades. “A colheita está caracterizada como atividade essencial, por isso, vai acontecer. Diferente de anos anteriores, mas será realizada”, afirma.

O parlamentar lançou duas cartilhas com orientações a produtores rurais: uma voltada aos cafeicultores (baixe aqui) e outra voltada a pecuária de leite (baixe aqui).

No noroeste capixaba, berço do café conilon no Espírito Santo, o presidente da Cooperativa Agrária de Cafeicultores de São Gabriel (Cooabriel), Luiz Carlos Bastianello, também acredita que os cafeicultores que necessitarem de mão de obra para a colheita dos grãos irão absorver trabalhares que perderam os empregos durante a pandemia do novo coronavírus.

“Oitenta por cento dos nossos cooperados fazem parte da agricultura familiar. Mas temos agricultores que necessitam de mais gente para colher o café de algumas propriedades. Acredito que eles vão aproveitar que algum parente ou amigo, que não esteja trabalhando possa ajudar na colheita”, disse Bastianello, em entrevista ao Notícias Agrícolas.

Segundo o presidente da Cooabriel, a falta de mão de obra não deve atrapalhar a colheita este ano, que já começou em algumas propriedades. Na região das Matas de Minas e Montanhas do Espírito Santo, onde atua a Cooperativa dos Cafeicultores da Região de Lajinha (Coocafé), a maioria das lavouras está em localidades frias e úmidas, sendo assim, muitas precisam aguardar no mínimo mais 30 dias para chegar a um grau de maturação mais uniforme.

Foto: Divulgação

A Cooperativa dos Cafeicultores da Região de Lajinha (Coocafé) se preparou com mais 5 mil metros quadrados para a armazenagem do café colhido nesta safra

O engenheiro agrônomo e diretor de produção e comercialização da cooperativa, Pedro Antônio Silva Araújo, lembra que a contratação de mão de obra para aqueles devem seguir as orientações decretadas pelos municípios. Isso garantirá, segundo ele, qualidade e volume de coleta de grãos.

“É importante seguir os protocolos de segurança indicado pelos órgãos para evitar problemas. Esse ano vamos ter um volume muito grande de café e, para isso, a cooperativa está se preparando com mais 5 mil metros quadrados de armazenagem. Contamos nessa etapa, com a ajuda dos nossos cooperados também”, finaliza Pedro Araújo.

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Bruno Faustino

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